POR ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO ATL
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) anunciou nesta quinta-feira (27), durante plenária do 19º Acampamento Terra Livre, uma nova mobilização nacional, de 5 a 9 de junho, em Brasília, contra o Marco Temporal – cuja retomada do julgamento está prevista para o dia 7 de junho.
“Em pouco mais de um mês estaremos juntos novamente aqui na capital federal para fazermos mais um acampamento de luta e resistência contra essa tese que está tramitando no Supremo Tribunal Federal (STF) e é uma verdadeira afronta aos direitos territoriais dos povos indígenas”, afirmou Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib.
A retomada do julgamento do Marco Temporal, tese anti-indígena que restringe o direito dos povos à demarcação de suas terras, está prevista para o dia 7 de junho. A tese, considerada inconstitucional, afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras se estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.
O julgamento trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.
“Sem demarcação, a gente não tem vida. Não tem território vivo, não tem esperança”, afirma Val Eloy Terena, coordenadora executiva da Apib. “Tudo o que nós queremos é que o marco temporal seja derrubado, para que a gente possa de fato dar continuidade às nossas culturas, às nossas vidas, e para que os nossos territórios sejam reflorestados novamente”.
Em 2017, no governo de Michel Temer, o marco temporal foi estendido também ao Poder Executivo, por meio do Parecer 001/2017, da Advocacia Geral da União (AGU). A decisão foi suspensa por liminar do ministro Edson Fachin, em 2020, mas a AGU não revogou o parecer. Maurício Terena, coordenador jurídico da Apib, alerta para a morosidade do órgão. “Temos informações de que a ministra Sonia Guajajara fez uma reunião com a AGU pedindo a revisão desse posicionamento, mas já estamos em abril e até agora nada aconteceu.”, afirma.
Julgamento da Corte
Em setembro de 2021, o julgamento foi suspenso após pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Alexandre de Moraes, após os votos do ministro Nunes Marques, favorável à tese anti-indígena, e do ministro relator, Luiz Edson Fachin, que proferiu voto contrário ao marco temporal e favorável aos direitos indígenas: “Entender-se que a Constituição solidificou a questão ao eleger um marco temporal objetivo para a atribuição do direito fundamental a grupo étnico significa fechar-lhes uma vez mais a porta para o exercício completo e digno de todos os direitos inerentes à cidadania”, declarou o ministro.
O julgamento deveria ser pautado novamente em junho de 2022, mas foi retirado de pauta pelo ministro Luiz Fux. Na avaliação da Apib, a indefinição a respeito da tese do Marco Temporal fragiliza a segurança dos territórios e incentiva conflitos e perseguições de lideranças indígenas.
Maurício Terena lembra que o que está em jogo é o debate sobre as teses do Indigenato (Direito Originário-congênito) e a tese do Fato Indígena (Marco Temporal), narrativa que argumenta que os indígenas somente teriam direito às suas terras se as tivessem em sua posse física na data da promulgação da Constituição. Ele adverte que a vitória desses argumentos representa grande perigo para os povos indígenas, implicando na anulação de procedimentos de demarcação e no aumento de conflitos e de atos de violência contra os povos e comunidades. “O Marco Temporal aponta a continuidade de um genocídio e etnocídio dos povos indígenas, pois sem território não tem saúde e nem educação para nós indígenas. Além disso, o seu julgamento também é climático. Somos nós, indígenas, que preservamos e protegemos todos os biomas. Tirar nossos territórios ancestrais é colocar em risco toda a humanidade”, diz o coordenador jurídico.
Das cerca de 1.300 terras indígenas, de acordo com levantamento do Conselho Indigenista Missionário, mais de 64% continuam à espera de regularização. Além disso, segundo relatório da Comissão Pastoral da Terra, do total de famílias afetadas pelo aumento dos conflitos no campo (171,6 mil), 56% são indígenas (96,9 mil). “Precisamos recuperar, o quanto antes, o estado de normalidade do processo legal de demarcação das Terras Indígenas no Brasil e acreditamos que a derrubada dessa tese possa reforçar uma segurança jurídica que estabilize nossos pleitos e preserve nossas vidas”, afirma Dinaman Tuxá, coordenador executivo da Apib.
Acampamento Terra Livre
Com o tema “O futuro indígena é hoje. Sem demarcação não há democracia!”, a 19ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL) acontece até sexta-feira (28) e pretende reunir mais de 6 mil pessoas na Praça da Cidadania, em Brasília (DF).
O ATL é organizado pela Apib e construído em conjunto com suas sete organizações de base, sendo elas: Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), pela Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul), pela Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste (Arpinsudeste), Comissão Guarani Yvyrupa, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Conselho do Povo Terena e Assembléia Geral do Povo Kaiowá e Guarani (Aty Guasu).
COMIN participa do ATL através da sua assessoria de comunicação e de projetos e é parceiro de organizações indígenas da região Sul e de Rondônia com o apoio para transporte através do projeto Moviracá: direito à terra indígena, fruto da parceria entre o movimento indígena e FLD-COMIN, financiado pela União Europeia, e do projeto com Pão Para o Mundo.