Com colaboração da ONU Brasil
Três mulheres e uma fundação receberam, na terça-feira (18), durante cerimônia realizada no salão da Assembleia Geral das Nações Unidas, o Prêmio de Direitos Humanos de 2018. Joênia Wapichana, primeira advogada indígena no Brasil e primeira mulher indígena a ganhar uma eleição para o Congresso brasileiro, foi uma das homenageadas com o prêmio. Além dela, foram premiadas a ativista dos direitos das meninas à educação, Rebecca Guymi, da Tanzânia, a advogada de direitos humanos no Paquistão, Asma Jahangit, que recebeu a homenagem póstuma, e a fundação irlandesa Front Line Defenders, que trabalha para proteger ativistas em risco.
Joênia é da tribo da Wapichana, do estado de Roraima. Após levar uma disputa de terras à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ela se tornou a primeira advogada indígena a comparecer perante a Suprema Corte do Brasil. Em 2013, foi nomeada a primeira presidenta da Comissão Nacional para a Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas e, em outubro deste ano, se tornou a primeira mulher indígena a ser eleita deputada federal, representando Roraima durante as eleições de 2018.
Falando em exclusivo à ONU News, Joênia disse que o prêmio significa o reconhecimento dos povos indígenas dentro do sistema de direitos humanos. “O prêmio, é justamente para dizer que nós aqui, neste mundo todo, somos parte da sociedade, com uma cultura diferente, forma de vida diferente, e ainda temos demandas. Então, ser reconhecida como defensora dos direitos humanos significa que tenho uma causa a defender. Essa causa tem que ser visibilizada dentro deste contexto da ONU.”
A ativista brasileira destacou ainda que para ela, um dos maiores desafios da atualidade é chamar atenção para aqueles que são os povos mais vulneráveis do planeta. “Porque é que eu falo que são vulneráveis, porque dependem da proteção de um território, dependem dos recursos naturais que ali protegem, e protegem com as sua própria vida. Existem muitos indígenas que estão sofrendo violência, conflito de terras, que fazem uma demanda de reconhecimento dos seus territórios como fundamental para a sua sobrevivência física e cultural, para a sobrevivência dos seus conhecimentos tradicionais que hoje estão ameaçados. Seria difícil eu pensar um mundo sem povos indígenas, e a gente tem toda uma mega diversidade, uma riqueza cultural, que, precisamos colocar em proteção.”
Prêmio
O Prêmio de Direitos Humanos das Nações Unidas é dado a cada cinco anos, sendo destinado a indivíduos e organizações que se destacam pelas conquistas extraordinárias em direitos humanos. Estabelecido pela Assembleia Geral em 1966, foi entregue pela primeira vez em 1968, pelo 20º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. As vencedoras e os vencedores são eleitas e eleitos por um comitê especial composto pelo presidente da Assembleia Geral, do Conselho Econômico e Social, do Conselho de Direitos Humanos, da Comissão da Condição Feminina e do Comitê Consultivo do Conselho de Direitos Humanos. O Alto Comissariado para os Direitos Humanos também participa oferecendo seu apoio a esse grupo. Este ano, mais de 300 nomeações foram recebidas de uma ampla variedade de fontes, incluindo Estados-membros, organizações das Nações Unidas e sociedade civil.
Cerimônia
Durante a premiação, o secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que as defensoras e os defensores dão voz àquelas e àqueles que não têm, protegem as e os impotentes contra a justiça e defendem todos os direitos: econômicos, civis, políticos, sociais e culturais. O chefe da ONU disse que elas e eles “apoiam o Estado de direito ou trabalham pacificamente para mudar leis e garantir que mulheres e meninas, comunidades indígenas, minorias e outros grupos marginalizados possam exercer seus direitos”. Ele lembrou que os homenageados agora dividem o prêmio com outros notáveis apoiadores como Eleanor Roosevelt, Martin Luther King, Nelson Mandela, Jimmy Carter e Malala Yousafzai, juntando-se a uma “lista de prestígio”.
António Guterres reconheceu durante o seu discurso que as defensoras e os defensores enfrentam frequentemente perigos como abuso, homicídio, tortura, detenções arbitrárias e outras tentativas de serem silenciadas e silenciados. Ele acrescentou que “no entanto, esses indivíduos e grupos corajosos continuam comprometidos em iluminar os cantos escuros do mundo, onde quer que ocorram violações de direitos humanos”.
A presidenta da Assembleia Geral, María Fernanda Espinosa, foi quem dirigiu a cerimônia e parabenizou aquelas e aqueles que receberam o prêmio de 2018. Ela pediu que não desistissem de suas convicções. Espinosa afirmou que sabe que “o caminho que eles escolheram é o mais difícil, porque é a estrada que eles lutam todos os dias, e embora suas conquistas possam ser temporárias, seus esforços valem a pena e são necessários, porque eles têm o potencial para mudar o destino do mundo.”
A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, também esteve presente na cerimônia e disse que as homenageadas e os homenageados são uma referência. Ela disse que “defender os direitos humanos não é apenas um ato nobre, mas um elemento essencial para as sociedades resolverem seus problemas, corrigirem erros e avançarem em direção à paz e à prosperidade.”
Sobre os demais premiados
Rebeca Z. Gyumi
Fundadora e diretora executiva da Msichana Initiative, organização da sociedade civil da Tanzânia que visa empoderar as meninas através da educação e enfrentar os desafios que limitam seu direito de obtê-las. Atuou por mais de oito anos em uma organização que trabalha com jovens, como defensora e personalidade de TV. Gyumi questionou a constitucionalidade dos artigos 13 e 17 do Ato de Casamento de 1971, que permitia que as moças se casassem aos 14 e 15 anos, quando há consentimento dos pais. Ela ganhou o caso perante o Supremo Tribunal da Tanzânia em 2016.
Asma Jahangir (1952-2018)
Principal advogada de direitos humanos no Paquistão, morreu em fevereiro deste ano devido a um derrame. Por três décadas, defendeu os direitos das mulheres, crianças, minorias religiosas e os pobres. Jahangir fundou o primeiro centro de assistência legal no Paquistão em 1986 e corajosamente assumiu e ganhou casos complexos. Ela sofreu ameaças e ataques públicos, além de estar sob prisão domiciliar por defender os direitos humanos. Foi eleita a primeira presidenta do sexo feminino da Ordem dos Advogados do Supremo Tribunal do Paquistão e da Comissão dos Direitos Humanos desse país. Quem recebeu o prêmio foi sua filha Munizae Jahangir, também ativista de direitos humanos e documentarista e correspondente do Paquistão para a televisão em Nova Deli, além de ser fundadora da South Asian Women in Media e membro da Comissão de Direitos Humanos do Paquistão.
Front Line Defenders
A Fundação Internacional para a Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos é uma organização fundada em Dublin, na Irlanda, em 2001, e visa proteger os ativistas em risco. A organização trabalha para atender as necessidades de proteção identificadas pelos próprios defensores e permitir que eles continuem seu trabalho sem o risco de assédio, intimidação ou prisão.