Uma grande mobilização dos povos indígenas marcou, na quinta-feira (31), o último dia do #JaneiroVermelho, referente à campanha “Sangue Indígena: nenhuma gota a mais”, lançada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) no começo deste ano. De acordo com a APIB, a estimativa é de que ocorreram atos em quase 60 locais no Brasil, em 22 estados e no Distrito Federal, e em oito países. Em algumas cidades ocorreram caminhadas, apresentações culturais e bloqueio temporário de rodovias, como a BR 101, na Bahia, e BR 386, em Santa Catarina. Também houve atos e rituais em certas comunidades indígenas.
A mobilização teve o objetivo de dar visibilidade à luta indígena diante do atual contexto político brasileiro de desmontes e retrocessos em várias conquistas de direitos dos povos originários, mobilizando a sociedade em defesa dos direitos indígenas e denunciando as crescentes ameaças. As principais reivindicações giram em torno da Medida Provisória (MP) nº 870, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) já no primeiro dia de governo. A MP retirou a Fundação Nacional do Índio (Funai) do Ministério da Justiça, realocando-a para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, e transferiu da Funai para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) a atribuição de identificar, demarcar e registrar as Terras Indígenas (TI), o que acaba por esvaziar o órgão indigenista e coloca nas mãos das defensoras e defensores do agronegócio o poder sobre as TI’s.
De acordo com a coordenadora da APIB Sonia Guajajara, em uma coletiva de imprensa realizada com lideranças indígenas, ontem (31), em frente ao Mapa, em Brasília, a garantia territorial é a principal bandeira de luta dos povos indígenas do Brasil. “Queremos nossos territórios demarcados para podermos ter direito à nossa cidadania plena, preservando nossa identidade”, ressaltou. Para ela, a transferência da demarcação das terras indígenas para o Mapa fragiliza ainda mais os território e a vida dos povos indígenas nas aldeias, além de ser uma clara demonstração de que o governo atual não irá mais demarcar terras indígenas no país.
Em todo o país e no exterior, nas falas das lideranças também ficou notável a preocupação dos povos indígenas com o crescente número de ataques às comunidades, ameaças de morte e invasões de suas terras. Sonia Guajajara afirmou que, desde a publicação da MP nº 870, os conflitos se intensificaram no país. Como exemplos estão os recentes episódios de incêndios em escolas e postos de saúde e ataques a tiros. “Já são 15 invasões em áreas de conflitos em apenas um mês. O que vamos esperar em um ano?”, questiona. A líder indígena atribui a crescente onda de violência contra os povos indígenas aos pronunciamentos do presidente Jair Bolsonaro, por demonstrarem “preconceito e desconhecimento quanto aos nossos povos”.
Esteve presente na coletiva também a primeira deputada federal indígena, empossada nesta sexta-feira (1º) na Câmara dos Deputados, Joênia Wapichana. Ela explicou que seu mandato irá focar no avanço e na defesa dos direitos coletivos indígenas “para que nenhum direito conquistado em 98 seja retrocedido e nenhuma gota de sangue indígena seja derramada”.
Outra pauta que esteve presente nas reivindicações foi a municipalização da saúde indígena, anunciada no dia das mobilizações. O atendimento aos povos indígenas é feito, hoje, nas próprias aldeias. Com a municipalização, as e os indígenas seriam atendidas e atendidos em centros de saúde junto às e aos demais cidadãs e cidadãos.
Além de Brasília, houve protestos em algumas cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Fortaleza, Cuiabá, Porto Velho, Campo Grande e no exterior em Nova Iorque, Washington, Londres, Lisboa e Zurique, entre outras.