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Organizações indígenas denunciam a falta de consulta aos povos indígenas na construção de PCHs em Rondônia

Organizações indígenas denunciam a falta de consulta aos povos indígenas na construção de PCHs em Rondônia
16 de junho de 2022 Comunicação FLD

Grupo esteve reunido na Aldeia Jatobá, Terra indígena Rio Branco. Foto: Leo Cruz/Kanindé

POR ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO COMIN

Representantes das organizações indígenas WIT’I–APRIW, WÃYPA-AIW, DOA TXÁTO–AIDT e ÕTAY’BIT, da Terra Indígena Rio Branco, Alta Floresta D´Oeste (RO), denunciam a falta de consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas durante a construção de oito Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs). Segundo as organizações, os empreendimentos impactam as Terras Indígenas Rio Branco e Massaco e a Reserva Biológica Guaporé.

Em manifesto, construído durante encontro na Aldeia Jatobá, Terra indígena Rio Branco, as organizações lamentam a falta de apoio e morosidade da Secretaria de Meio Ambiente (SEDAM) e da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e afirmam que os prejuízos desses empreendimentos são irreversíveis e permanentes: “Desde a construção da primeira PCH, estamos denunciando os prejuízos que estamos sentindo”.

Diante das inúmeras violações, as organizações apresentaram inúmeras medidas para a diminuição e mitigação dos impactos da construção das PCH’s, entre elas a participação ativa em todas as etapas da Avaliação Ambiental Integrada/Componente Indígena e na definição de todas as medidas a serem adotadas.

“Exigimos que a Avaliação Ambiental Integrada/Componente Indígena seja imediatamente concluída, contemplando a identificação de todos os danos causados e as medidas a serem adotadas. Para isso, apelamos ao MPF em Ji-Paraná/RO que cumpra com seu papel de defesa dos direitos indígenas.” O manifesto também reafirma que as organizações não aceitarão que nenhuma PCH ou empreendimento seja realizado na sub-bacia do Rio Branco, “porque, para nós, o rio não é capital, mas nossa fonte de vida.

Entre as medidas discutidas pelas organizações, está a identificação dos danos causados pelas PCHs. Foto: Equipe COMIN

Leia o manifesto na íntegra abaixo ou acesse aqui

Manifesto

Nós, representantes das organizações indígenas Associação dos produtores rurais indígenas WIT’I –APRIW, Associação indígena WÃYPA – AIW, Associação indígena DOA TXÁTO – AIDT e Associação Fluvial ÕTAY’BIT, da Terra Indígena Rio Branco, Alta Floresta D´Oeste/RO, denunciamos que 8 Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) foram construídas ao longo do Rio Branco sem consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas e sem nenhuma outra observância à legislação ambiental e indigenista.

Esses empreendimentos impactam frontalmente as Terras Indígenas Rio Branco e Massaco (povos indígenas em isolamento voluntário), bem como a Reserva Biológica Guaporé. A primeira delas foi construída no início da década de 1990 e, a partir daí, passamos a sofrer prejuízos de ordem social, cultural, econômica, ambiental e de risco de morte, sem que nenhuma medida para evitar e/ou diminuir essas violências fossem tomadas pelos empreendedores. Lamentavelmente, o órgão licenciador, SEDAM (Secretaria de meio Ambiente), e o órgão indigenista, FUNAI, fizeram vistas grossas a essas agressões, permitindo que elas continuassem ao longo dessas quase três décadas. Desde a construção da primeira PCH, estamos denunciando os prejuízos que estamos sentindo.

Diante de nossas pressões, em 2010, o Ministério Público Federal (MPF) promoveu um acordo com os empreendedores e SEDAM para uma Avaliação Ambiental Integrada da sub-bacia do Rio Branco, com componente indígena-AAI/CI. Entretanto, até hoje os estudos não foram concluídos por morosidade dos empreendedores, do órgão licenciador e da FUNAI.

Enquanto isso, estamos sentindo prejuízos irreversíveis e permanentes, tais como: erosão e assoreamento do rio, e oscilação do nível de água em decorrência da abertura e fechamento de comportas, o que afeta a desova dos peixes e quelônios, causando a diminuição de algumas espécies de peixes e quelônios e dificuldade no transporte de membros das comunidades. Isso já causou morte de indígena por falta de navegabilidade no leito do rio e má qualidade da água do rio, sendo imprópria para consumo, pois causa diarreia e coceira.

Observamos também que, ao longo do rio, tem acontecido, nos últimos anos, uma grande mortandade de peixes e plantas aquáticas, que pode ser consequência do uso de veneno para matar o tarope (aguapé) nos reservatórios. Essa mortandade se repetiu no final de 2021 e foi amplamente divulgado pela mídia local.

Denunciamos que os empreendedores destruíram o cemitério do povo Djeoromitxi e muitos sítios arqueológicos de vários povos, com clara intenção de apagamento de nossa memória sagrada.

Também, no estudo, não levaram em consideração a existência de indígenas em isolamento voluntário. Com isso, ignoram os impactos que esses povos podem estar sofrendo. Por outro lado, a TI Massaco vem sofrendo pressão agropecuária sem que nenhuma medida seja tomada.

Diante de todas essas violações e tantas outras mais, manifestamos que não queremos que nenhuma discussão ou estudo sejam realizados sem que sejam incluídas as seguintes medidas para diminuição desses prejuízos:

1) reflorestamento de todas as nascentes impactadas e mais as necessárias em áreas adjacentes e reflorestamento das margens dos rios e mananciais e outras adjacentes para recomposição de prejuízos de acordo com o que apurado em estudo específico;

2) medidas imediatas para acabar com o assoreamento do rio;

3) manutenção da vazão do rio com regularidade, mesmo que para isso tenha que interromper totalmente o funcionamento das PCHs;

4) criação de áreas artificiais ou não para procriação de tracajás e peixes que foram impactados por mortandade;

5) criação de corredores em todas as PCHs que funcionem com represamento do rio, para a desova das espécies impactadas;

6) criação de mecanismos de navegabilidade aos indígenas que se utilizam do rio para deslocamentos;

7) impedir desmatamento na região, bem como fiscalizar o território indígena contra roubo de madeira, pesca predatória, invasão, caça, garimpo ou outro meio nocivo e ilícito que prejudique as comunidades;

8) construção e manutenção, pelos responsáveis (estado de Rondônia e empreendedores), de escolas, postos de saúde, postos de fiscalização, espaços culturais, estradas, etc. nas comunidades indígenas;

9) entrega às comunidades indígenas de meios de transporte fluvial, como embarcações, voadeiras ou outros, e toda a estrutura, como combustível e manutenção;

10) pagamento de indenização pecuniária, em valor a ser apurado com ajuda direta do MPF/6ª Câmara, às comunidades indígenas pela outorga das licenças ambientais irregulares, bem como do irreversível dano ambiental, cultural, social, arqueológico e econômico a que foram submetidos;

11) que seja criado um “museu arqueológico indígena” na cidade de Alta Floresta D’Oeste às custas dos empreendedores, inclusive na sua contínua manutenção;

12) que não sejam emitidas novas licenças ambientais para construção de novos empreendimentos hidroelétricos (CGH, PCH, UHE) ou qualquer outra obra que impacte a sub-bacia do Rio Branco ou afete quaisquer das comunidades indígenas ou grupos em isolamento voluntário;

13) que a REBIO Guaporé e T.I. Massaco sejam excluídas do programa “Adote um Parque”, do Governo Federal, criado pelo Decreto 10623/09/02/2021, em especial pela existência de povos isolados;

14) que os empreendedores apoiem financeiramente, com aportes permanentes a serem definidos, a Frente de Proteção Etnoambiental Guaporé/FUNAI para proteção da TI Massaco;

15) que seja criado um programa de segurança de barragens, específica e diferenciada, para as duas Terras Indígenas Impactadas (TI Rio Branco e TI Massaco);

16) que seja feito, pelos empreendedores às comunidades indígenas afetadas, pagamento pecuniário permanente enquanto perdurar a existência dos empreendimentos, como meio de compensação pelos prejuízos causados;

17) monitoramento contínuo da qualidade da água do Rio Branco, com medidas para que a água saia da classe 2 para a classe 1, conforme recomendação do CONAMA;

18) fornecimento de energia elétrica de qualidade e gratuita para as comunidades indígenas, contemplando também as comunidades da área fluvial;

19) construção e manutenção de estradas até a aldeia Formigueiro;

20) que o órgão ambiental não aprove PACUERAs (Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno do Reservatório Artificial) que tenham atividades de turismo;

21) que seja feito um programa de apoio a atividades produtivas e extrativistas das organizações e comunidades indígenas.

Essas são propostas básicas para, minimamente, diminuir ou mitigar os impactos e prejuízos por nós sofridos. Para sua efetivação, exigimos participar ativamente de todas as etapas da Avaliação Ambiental Integrada/Componente Indígena e na definição de todas as medidas a serem adotadas.

Exigimos que a Avaliação Ambiental Integrada/Componente Indígena seja imediatamente concluída, contemplando a identificação de todos os danos causados e as medidas a serem adotadas. Para isso, apelamos ao MPF em Ji-Paraná/RO que cumpra com seu papel de defesa dos direitos indígenas.

Por fim, reafirmamos que não aceitamos nenhuma PCH a mais ou qualquer outro empreendimento na sub-bacia do Rio Branco porque, para nós, o rio não é capital, mas nossa fonte de vida.

 

Aldeia Jatobá, Terra indígena Rio Branco, 12 junho de 2022.

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