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“Nada é por acaso, temos que resistir”

“Nada é por acaso, temos que resistir”
5 de maio de 2017 zweiarts

Uma jovem Kaingang, participante novata do Acampamento Terra Livre (ATL), se espantou com a repressão e controle policialesco sofrido durante todo o evento em Brasília/DF, na semana de 24-28 de abril de 2017. O espanto da jovem reflete o sentimento vivido durante o Acampamento, onde a repressão não foi dissimulada. Diante desta situação, a jovem afirmou: “nada é por acaso, temos que resistir”. A presença de forças policialescas no entorno do local do evento, próximo ao Teatro Nacional, na Esplanada dos Ministérios, foi intensa, por vezes ameaçando, realizando manobras que evidenciavam uma entrada forçada. A intimidação se intensificava com os sobrevoos do helicóptero das forças policiais no local em que se reuniam aproximadamente 3.500 pessoas, grupo massivamente composto por membros de diferentes povos indígenas e lugares do Brasil.

A resistência e a disposição para o seguimento das conquistas e avanços dos direitos dos povos indígenas prevaleceram sobre as situações de intimidação. A disposição para o engajamento no movimento indígena em nível nacional, como a participação no ATL, as ações de impacto sobre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e manifestação e mobilização junto à sociedade em geral ficaram evidentes durante o evento. O fortalecimento do movimento se caracterizou pela presença e manifestação, no ATL, de povos originários de outras partes do mundo, através, por exemplo, da elaboração de documentos conjuntos.

 

Mobilizações regionais ou locais, como os protestos realizados na região sul do Brasil, também se evidenciaram no mesmo período[1]. Estes protestos locais/regionais se manifestaram contra as reformas desastrosas do atual presidente; contra a indicação de nomes para cargos, sem respeito ao respaldo dos povos indígenas[2]; desrespeito aos mecanismos internacionais de garantia de direitos (declarações da ONU, OEA e OIT), das quais o Brasil é partícipe e que ferem a autodeterminação, autonomia e cidadania dos povos indígenas.

Como ‘nada é por acaso’, ainda na semana do ATL os atos de violência e intimidação também vieram do Congresso Nacional, onde representantes indígenas foram impedidos de ingressar em uma audiência pública[3]. Um deputado federal afirmou que a próxima reforma no Congresso será a ‘reforma dos indígenas’, no intuito de permitir o arrendamento das áreas agrícolas e exploração mineral e de recursos naturais das terras indígenas[4].

Este último fato evidencia a postura do atual Legislativo, amplamente desfavorável aos povos indígenas, como revelam os noticiários de violências contra povos indígenas no Brasil, dessa vez pela situação de confronto com o povo Gamela (Viana/MA). A situação do ATL e do povo Gamela evidenciam uma política nefasta e arcaica de contestação de direitos dos povos indígenas no Brasil. Como já ocorrido na região sul do Brasil em novembro de 2013, em Vicente Dutra/RS[5], na situação de Viana/MA há, novamente, a denúncia de incitação pública por parlamentar federal daquele Estado[6].

E como ‘nada é por acaso’, na semana seguinte ao ATL, a CPI FUNAI/INCRA 2 divulgou um relatório de mais de 3.300 páginas, indiciando lideranças indígenas, antropólogos e antropólogas, entidades e procuradores e procuradoras da República, propondo ao Ministério da Justiça e Segurança Pública “a reanálise, no âmbito da demarcação de terras indígenas, dos procedimentos administrativos em andamento”. Mesmo com a proposta de o Ministério da Justiça e Segurança Pública fazer um mutirão de demarcações de terras indígenas[7], ela não ameniza a situação, nem desmobiliza os povos indígenas na insistência de ecoar o grito: Demarcação Já!

No documento final do ATL, os povos indígenas reafirmam a postura de resistência e conclamam: “Reafirmamos que não admitiremos as violências, retrocessos e ameaças perpetrados pelo Estado brasileiro e pelas oligarquias econômicas contra nossas vidas e nossos direitos, assim como conclamamos toda a sociedade brasileira e a comunidade internacional a se unir à luta dos povos originários pela defesa dos territórios tradicionais e da mãe natureza, pelo bem estar de todas as formas de vida”.

“Mas, que nada! Fiquei mais forte!”

A jovem Kaingang, recuperada do impacto, também afirmou: “Mas, que nada. Fiquei mais forte!” Com isso, ela evidencia que os desafios e as situações de contestação evocam o juntar forças, o unir-se na pluralidade e diversidade, na resistência e resiliência, como também proposto no Documento Final do 14º ATL: Unificar as lutas em defesa do Brasil Indígena[8].

O COMIN, no ano que celebra seus 35 anos de parceria, solidariedade e apoio aos povos indígenas, soma-se as suas forças e refuta veementemente todas as formas de violência contra os mesmos. Refuta veementemente o relatório da CPI FUNAI/INCRA 2, conduzido e elaborado com o intuito de tolher e restringir os direitos dos povos indígenas no Brasil, criando condições para que se instaurem processos de aniquilamento, retrocesso e obscurantismo, incompatíveis com a sociedade justa, democrática, participativa, equânime e plural que almejamos.


[1] Disponível em: mobilizacaonacionalindigena.wordpress.com.

[2] Disponível em: cartacapital.com.br.

[3] Disponível em: 12.senado.leg.br.

[4] Disponível em: outraspalavras.net.

[5] Disponível em: zh.clicrbs.com.br.

[6] Disponível em: oglobo.globo.com.  Destaque: “O deputado federal Aluisio Guimarães Mendes Filho (PTN/MA), ex-assessor presidencial de José Sarney e secretário de Segurança Pública na última gestão do governo de Roseana Sarney, teria estimulado o ataque após dar entrevista a uma rádio local”.

[7] Disponível em: folha.com.

[8] Disponível em: mobilizacaonacionalindigena.wordpress.com.

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